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21 julho, 2011

A mulher da minha vida

Sou um homem privilegiado. É assim, com um tom de aparente soberba, que começo este texto. Mas não se enganem, acredito que todos concordarão comigo ao término do texto.

Sou privilegiado porque tenho grandes mulheres em minha vida. Pra começar, claro, minha amada mãe, a quem devo muito do que sou e quem está sempre de braços abertos para me ajudar onde quer que eu precise. Também tenho uma irmã na mesma linha: dedicada, esforçada e sempre disposta a ajudar a quem precisa. Lembramos frequentemente das nossas briguinhas de irmãos na infância e, sempre com muitas risadas, contamos as peripécias para quem quiser ouvir. Nunca houve uma única briga real entre nós e, se não chegamos a trocar roupas, o único motivo é porque tenho um peso e tamanho bem maior do que ela além, evidentemente, eu não querer, jamais, utilizar seus vestidos. No mais, o que era de um era também do outro, como cremos que deve ser entre irmãos, pais, esposas, filhos e filhas.

Há algum tempo, coisa de cinco anos, conheci outra mulher da minha vida: minha esposa. Nosso caso foge um pouco às histórias mais comuns, pois nos conhecemos nos bastidores de uma ópera de estudantes, onde eu era um dos coristas e ela a maquiadora do grupo. Bem, fazendo minha maquiagem, ela acabou me olhando tão profundamente nos olhos que arrebatou meu coração e já se vão cinco anos juntos, com direito a casamento Celta e uma festa bastante diferente. E, de tão especial que é esta mulher em minha vida, me trouxe outra mulher especial, ainda pequenina: sua filha, minha enteada, que é tão minha filha quanto é de minha esposa. Uma menina super esperta e agitada, com uma energia inesgotável e que, por isto mesmo, nos dá uma canseira só remediada pelo seu carinho, tão inesgotável quanto sua energia.

Contudo, o objeto deste texto não é falar sobre nenhuma das mulheres acima, todas mulheres da minha vida e com uma importância incomensurável, mas da mais nova mulher em minha vida. Sim, ainda um projeto de mulher, mas sem dúvida a mulher que mais mudou a minha vida, especialmente se considerarmos um período recente. Minha filha mais nova, Samyah, veio ao mundo em Junho de 2009 e, desde o exato momento de seu nascimento, deu para mim a maior emoção que um pai pode ter, que é ver sua filha sair do conforto e proteção da mãe para meus braços. É gostoso brincar com minha esposa e dizer que ela carregou a pequena por nove meses, mas fui eu quem a segurou nos braços primeiro. E daí para a frente foram sucessões de novidades: a primeira vez que sentou sozinha, as tentativas de se levantar, em pé segurando nossas mãos, esboços das primeiras palavras, enfim, a cada dia uma novidade deliciosa de ver acontecer. Até que...

No início de 2011, passamos alguns dias em viagens de férias, onde nos deliciamos com cachoeiras, trilhas e tudo mais que um passeio ecológico pode oferecer. Quando voltamos, começou o que eu posso considerar o período mais difícil de minha vida: a Samyah teve contato com uma bactéria chamada Escherichia Coli e esta bactéria causou uma Síndrome Hemolítico Urêmica em seus rins. Traduzindo em miúdos: os dois rins pararam de trabalhar completamente. Em dois dias apenas, saímos de um estado de felicidade para o desespero, pois a situação dela ficou tão grave que fomos aconselhados pelos médicos a nos prepararmos e à nossa família para a perda de nossa bebê. E então nossa rotina foi drasticamente alterada, minha esposa diariamente no hospital e eu em visitas diárias, com algumas pessoas nos ajudando muito, especialmente com nossa filha mais velha. Em um destes dias, tanto eu quanto minha esposa, já esgotados pelo cansaço e estresse com a situação, tivemos uma discussão. Neste dia eu chorei... Chorei forte e profundamente, como não acontecia havia mais de quinze anos. Foi um desabafo fortíssimo, embalado pelo medo da perda de minha filha. Com este desabafo chegou uma espécie de consolo espiritual, que foi se transformando em entendimento e aprendizado nos dias que se seguiram. Cada dia uma coisa nova, um entendimento mais amplo de várias coisas e a esperança pela melhora da pequena sempre se renovando. Até que, finalmente, saiu a primeira gota de urina na sonda, depois de mais de dez dias sem. Festa! Iniciamos um processo de quase euforia, pois a Samyah passou a reagir muito rapidamente ao tratamento e a quantidade de urina aumentava exponencialmente a cada dia. A isto se seguiram as adequações nas medicações, sondas retiradas e também o respirador, aquela coisa que deixa os enfermos com uma aparência tão pesada, foi removido. Finalmente nós pudermos ver o rosto sereno de nossa pequena livre dos aparelhos. Finalmente, com o término da sedação, ela acordou, e pudemos contemplar aqueles olhinhos tristes brilhante e nos pedindo colo. Claro que estava muito nervosa, sem saber o que estava se passando e sem conseguir se mexer muito bem. Mas estava viva, fora de risco de morte e podendo ser aconchegada novamente em nossos braços.

Assim se seguiram os dias, até completarem 32 dias de internação, 29 destes na UTI. A Samyah virou xodó das enfermeiras e equipe médica, encantando a todos com suas peripécias. Quando teve alta, a Samyah ainda tinha pequenos problemas de orientação motora, coisa já resolvida apenas dez dias após a alta médica. E embora o tratamento que ela esteja fazendo ainda possa durar muitos meses e restar alguma seqüela, voltou a ser aquela criança arteira, sorridente e fazedora de nossa mais completa felicidade.

Durante este mês - que mais se pareceu com um ano - aprendi que nunca havia tido problemas de verdade, apenas pequenos contratempos e que há pessoas com problemas infinitamente mais sérios que os meus. Também aprendi que receber ajuda de pessoas que você não espera receber, até de pessoas da empresa onde você trabalha e que mal conhece, é uma surpresa extremamente gratificante e que nos faz valorizar cada pequeno ato de bondade e, principalmente, valorizar cada ser humano com suas qualidades e seus defeitos. Enfim, aprendi tantas coisas que poderia escrever um livro inteiro, mas, especialmente, aprendi a dar valor às coisas que eu sempre tive e que não valorizava como devia: Amor, Amizade e Família. Estes são os pilares que levarei para o resto dos meus dias.

Como eu disse lá em cima, me considero mesmo um homem privilegiado, afinal, tenho muitas mulheres em minha vida, todas com sua importância e todas necessárias para meu viver. Mas foi por tudo que passei e aprendi nestes últimos dias que escolhi minha pequena filha Samyah para homenagear como "A mulher da minha vida."

* Este texto foi um dos vencedores de um concurso cultural realizado na empresa onde trabalho, onde os participantes deveriam fazer um texto sobre "a mulher da sua vida" e justificar os motivos da escolha.

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